Quando a Globo nos permite (sem querer) um sopro de esperança

Não assisto BBB. Primeiro porque nem tenho TV. Mas talvez seja alguma coisa da idade: não consigo entender onde está a graça de ficar olhando um monte de gente conversando amenidades em uma casa e se pegando por baixo do edredom. Acho ainda mais inacreditável sites como o UOL manterem parte importante da sua página dedicada a esse programa, passando por cima na hierarquia de exibição, de notícias sobre a Síria ou qualquer outra coisa um tanto mais importante (imagino que o UOL ganhe uma nota da Globo para fazer isso). Mas parece que isso faz algum sucesso, na classe média que assiste a Globo, as vezes meio lobotomizada, porque a emissora já está na sei-lá-quantiava edição.

É com certeza meio preconceituoso da minha parte, mas sempre associei quem assiste ao BBB àquelas pessoas que entram nos comentários das notícias sobre direitos humanos para falar de humanos direitos, para soltar algum comentário racista, machista, homofóbico, ou de elogio ao Bolsonaro. Aqueles que nos fazem ter desesperança no Brasil toda vez que resolvemos ler qualquer site da grande mídia.

Mas confesso que há algum tempo me intrigava sobre como esse tipo de programa, que até onde sei define seus vencedores pelo voto do público (embora pelo histórico da Globo desconfie sempre se isso não é manipulado), podia ter levado à vitória um sujeito tão incrível quanto o Jean Wyllys . O cara foi pro PSOL, elegeu-se deputado, e tornou-se uma dos mais íntegros e inteligentes políticos de esquerda, defendendo justamente as bandeiras dos direitos humanos e da luta contra a homofobia.

E não é que esta semana fomos surpreendidos de novo? A vencedora desta última edição do BBB, Gleici Damasceno, é ativista pelos direitos humanos, filiada ao PT (como isso passou nos filtros da seleção?), e soltou um maravilhoso "Lula Livre" quando saiu do confinamento. Ao vivo e a cores (veja aqui). 

Fico pensando que isso nos dá muitas esperanças. Porque mostra que, ao contrário do meu preconceito, a população que assiste ao BBB e acompanha jovens por meses confinados em uma casa, vai simpatizando justamente com quem provavelmente, lá dentro, tenha a conduta mais ética, mais pautada por valores humanitários e de respeito ao próximo. Porque geralmente essa é a conduta de quem é ativista pelos direitos humanos, como ela. Sei que nem sempre aconteceu, que outros vencedores das muitas edições não devem ser assim, ou talvez devesse analisar todos os vencedores de todas as edições para saber se isso é uma regra ou não. Mas não importa, só esses dois, o Jean e a Gleici, são suficientes para nos dar esperanças.

Fico pensando se a Globo pusesse lá naquela casa um brucutu pró-Bolsonaro (se é que já não teve, não tenho a menor ideia já que não assisto), o que aconteceria? Será que duraria muito?Soube que uma vez um cara teve que ser expulso porque bateu numa moça, numa das festas, e a pressão dos espectadores forçou a Globo a retirá-lo. Outro bom sinal.

O fato é que isso tudo nos dá esperanças. Afinal, no Brasil, na última grande eleição nacional que tivemos, quem ganhou foi o campo progressista. Justamente por isso, tiraram a presidente eleita à força num golpe baixo e montaram farsas atrás de farsas para impedir a próxima eleição democrática. E temos a impressão, pelo espaço que a mídia dá aos "pensadores" e "especialistas" da extrema direita, pelos milhões investidos em propagandas antidemocráticas e anti-humanitárias, pelas ações autoritárias da justiça e da polícia contra o direito à livre expressão de esquerda, pela absoluta cara-de-pau com que as pessoas falam monstruosidades nas redes sociais, de que o país foi-se pelo ralo. Que sobrou apenas por ai gente que quer matar homossexual nas ruas. Mas parece que, por debaixo disso, nossa sociedade talvez não esteja tão rendida assim. Como parece que disse o próprio Lula, lá da prisão, "no voto, a gente ganha sempre".

Que sopro de esperança os telespectadores do BBB deram hoje ao dar a vitória a essa moça. Tomara que ela seja uma nova Jean Wyllys. A Globo teria que suportar a pecha de ser uma fábrica de políticos de esquerda. 

Será que devo começar a assistir o BBB?